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Túnel do Tempo:- De como fui ser radioamador. Virgílio Rocha, o inspirador

ù(Republicado a pedido da amiga e leitora Vânia Assunção)

Por Gil Alves Santos

1 – A curiosidade mais a bisbilhotice sempre foram o combustível de meus já enfraquecidos neurônios. Não sou estudioso e detesto o qualificativo “intelecutual.” Nem tenho essa pretensão! Na minha cabeça o intelectual é egoísta, misantropo. Tem no seu umbigo o eixo do mundo. Quanto a mim, como qualquer mortal mediano gosto de ler – e nada além disso.

2 – Em 1957 – quem não se lembra da Rural Willys, da Robusterina, do Phimatosan, das calças de Nycron, do pente Flamengo, da Pasta Janax, para carapinhas como as minhas -, vindo das chapadas do Buriti-Cortado, da Tapera, do Zumbi e da Canoa, eu já era estudante nesta boa Timon, arrastando os meus tamancos feitos de maria-mole, naquela que ficou conhecida como Avenida Getúlio Vargas, o caminho das canoas, hoje apenas Avenida do SAE, na qual mora o meu amigo Valdemir Moraes, como eu, bancário aposentado. No

Zumbi, década de 1950, hoje área do INCRA, fui um bom caçador na companhia do cidadão Miguel Pereira de Oliveira, conhecido como Miguel Dionísio – no povoado existe uma unidade escolar com o nome de tão ilustre figura – homem íntegro que enfrentava a vida com boas gargalhada e uma expressão exclusivamente sua:- Oi, marvado.

3 – Na época circulava a Revista O CRUZEIRO(tenho alguns exemplares bem guardados e conservados), objeto de minhas bisbilhotices na gráfica do Padre Delfino, de cujas páginas recortei um cupom do INSTITUTO UNIVERSAL BRASILEIRO, que, à distância e pelo Correio, ensinava diversos e vários cursos, entre eles, o de ELETROTÉNICA, que escolhi. Semanalmente ia eu, toc-toc-toc-toc-, de tamancos, à agência do então Departamento dos Correios e Telégrafos(DCT), que funcionava na esquina da Rua Luís Domingues com a Rua Coronel Falcão. Aqui, a minha curiosidade foi aguçada, mais ainda, ao ver que um servidor circunspecto, aloirado, de pouca conversa, cioso de sua importância, dominava um batedor até então estranho para mim, mas percebia que era revestido do metal cobre, e dava para entender que alguma coisa, pois o texto estava à sua frente, estava sendo transmitida. Era o TELEGRAMA, cujo caminho começava – ou terminava – pela antiga Rua do Fio do

Telégrafo, ou apenas, Rua do Fio, hoje, Rua Firmino Gonçalves Pedreira. Nome desse senhor, já falecido: VIRGÍLIO ROCHA – de Virgis, Virga, aquele que com os ramos, sai ensinando às pessoas. Rocha é rocha mesmo – que também fazia a entrega dos telegramas no endereço de recepção. A Rua do Fio, na verdade, era os postes de ferro-gusa que se estendiam mundo a fora com os fios de cobre como condutores, aqui em Timon, das mensagens transmitidas e recebidas pelas mãos hábeis do competente servidor do DCT, Virgílio Rocha. Também serviam eles, postes e fios, como trilha para nós, tropeiros de jegues, vindos do interior, com surrões de babaçu diretamente para os armazéns do Sr. Luiz Firmino de Sousa. Verdadeiramente uma maravilha. Tempos maravilhosos em que o respeito, a ordem e a disciplina faziam parte das famílias brasileiras, e em especial, desta Timon. Não existia violência!

4 – Uma vez por semana, toc-toc-toc-toc, lá estava eu, nos Correios, devolvendo as lições do IUB, olhando com atenção para a mão direita e aveludada do Sr. Virgílio, que com incrível rapidez batia naquele estranho objeto transmitindo mensagens codificadas para pessoas à distância, em outras cidades, outros estados. Conversa vai, conversa vem, fiquei sabendo que o tal batedor chamava-se manipulador e o código, era, como

ainda o é, O ALFABETO MORSE, desenvolvido com traços e pontos – di-di-di-dá-dá-dá – inventado em 1835, por Samuel Breese Morse, que, curiosamente, era pintor e não eletricista. O telefone praticamente sepultou o morse ou CW, na linguagem radioamadoristística, que resiste à modernidade. Nasceu em mim, iluminado pela sabedoria e praticidade do Sr. Virgílio, o desejo de ser empregado dos correios não sem antes aprender o alfabeto Morse. Deixando o Exército, tempos depois, fui nomeado pelo Presidente João Goulart, para o DCT de Teresina, emprego que dispensei, pois já estava concursado para o Banco do Brasil. Mas nunca esqueci a vontade de aprender MORSE tendo como exemplo a figura do Sr. VIRGÍLIO, levando, ele mesmo, a notícia dos ausentes. Na década de 70 fui ser radioamador – PS8-GA – sendo obrigado a aprender o código cifrado, ainda hoje matéria exigida no exame de quem pretende ser radioamador. Tenho duas modestas estações – uma em HF, YAESU FT-747-GX, fixada na Canoa de meu pai, GENÉSIO, que recebe também os sinais do alfabeto MORSE; e uma móvel, VHF, ICOM-IC-V8. Própria para DX e já nos padrões da modernidade, conservo o S-2000, da TECSUN, importado, que sintoniza até as conversas dos jogadores de dama postados em frente da prefeitura da nossa Timon. Não tive o privilégio de conhecer de perto os familiares do Sr. VIRGÍLIO, que a mim, por evidente, também não conhecem. Mas foi no

exemplo de seu ofício, exímio telegrafista que era, que hoje sou RADIOAMADOR. Foi ele uma figura notável desta Timon, merecedor do respeito e das considerações de todos. Será um dos notáveis do Pantheon que há de ser construído louvando os homens de bem de nossa cidade. Sem dúvida, um grande homem, um sábio qual o Virgílio de Dante.

5 – Quero aqui relembrar, a propósito do Código MORSE, a importância da telegrafia na trágica colisão do transatlântico TITANIC contra um iceberg às 23:41 horas do dia 14 de abril de 1912, em sua viagem inaugural entre as cidades de Southampton, Inglaterra, e New York, nos Estados Unidos[ver Uma Noite Fatídica, de Walter Lord, editora Três Estrelas]. À meia noite do dia 15 – 15.04.1912 – a estação de comunicação do navio começava a transmitir ao mundo dentro dos limites do rádio daquela época através do telegrafista-chefe Sr. Philips, evidente que em Morse, as letras C-Q-D; C-Q-D. Na época, era o sinal tradicional para pedir socorro, seguidas de M-G-Y, que era o prefixo do TITANIC. C-Q-D, significa “CAME-QUIK-DISASTER” ( = Venham Depressa, Desastre). A partir desse momento os dois telegrafistas do TITANIC passaram a transmitir a mensagem de socorro sem descanso; o primeiro navio a receptá-la foi o CARPHATIA, 58 milhas ao sul de sua posição(uma milha náutica mede 1.852 metros) rumando imediatamente para o local do desastre. Diversos outros navios captaram o pedido de socorro, inclusive o OLIMPIC, irmão gêmeo do TITANIC e que se encontrava a 500 milhas de distância do local do desastre. Consta, ainda, que um Radioamador de New York, captou sinais de socorro do TITANIC e os retransmitiu para outros colegas. Exatamente a 01:30 horas o telegrafista chefe, Sr. Philips, transmitiu para o espaço o primeiro S-O-S da história que permanece até os dias de hoje, como sinal de socorro: S-O-S, “SAVE-OUR-SOULS” e quer dizer “Salve-Nossas-Almas. Os telegrafistas do TITANIC foram dispensados das funções às 02:17 horas e às 02:20 horas o enorme transatlântico desapareceu para sempre da superfície do mar, levando em seu bojo 1.500 vidas humanas – sem culpa da telegrafia, pois no episódio ela foi de total competência.

Até breve!

Gil Alves dos Santos é advogado militante da Justiça do Trabalho e da Justiça Federal ([email protected]) – 86-99972-0524

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Elias Lacerda

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Jornalista apaixonado pela notícia e a verdade