Artigo : Uma Fenda na Escuridão

Uma fenda na escuridão

É uma fenda. Um lindo e estreito punhado de luz. Eu a encaro na escuridão deste quarto surdo. Imagino os cenários mais graciosos que já vivi até aqui. Mares, flores, a voz de pessoas queridas, tudo tão propenso a causar saudade. Tudo que nós vimos foi perfeito e interminável na memória. Como se fosse sem fim. Pergunto-me, porque tantas metáforas padecem sem explicação. Não há nada que pudesse ser feito a respeito do destino e do passado. Ambos escritos com a mesma tinta insondável. Eu os projeto no teto do quarto sob a pequena faísca luminosa. Mas não há luz o bastante para que sejam compreendidos. É uma luz finíssima, assim como nosso entendimento sobre tudo isso.

Estou vendo onde poderíamos chegar se tudo tivesse dado certo. Atravessando através do medo. O inimaginável. Como se só existisse um momento absoluto e um sentimento genuíno. Tudo que passa pelos olhos em segundos. Noites de insônia como esta. Onde refletir é tudo que cabe no tempo. As cenas mais inacreditáveis que poderiam ter acontecido. Sim, as maiores e mais trágicas lembranças. Todas flutuando no teto. Como se fosse um abismo. Afundando. As flores brancas na mesa da cozinha. A última vez que meu nome foi pronunciado. A assiduidade da morte. Essas ruas se tornaram tão largas. As lembranças ardem, ferem o sono devagar. A sensação que, fosse qual fosse a história, sempre seria contada da mesma forma. Sob um signo tão inconstante e áspero. As poucas certezas são mais maleáveis que a água. Por este caminho vim várias vezes trazendo flores. E por esta luz todos passarão um dia. É interminável. Como um regramento. São muitas imagens. Opacas. Sem brilho algum. Todas perdidas, em tumulto. Eu as observo. Ainda mais a chuva varre o silêncio. E de momento em momento, tudo parece um sonho movendo-me na escuridão destas longas horas.

Daniele Lima

( Jornalista timonense)

Elias Lacerda

Jornalista apaixonado pela notícia e a verdade

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