Saúde

SOBRE DEGRADAÇÃO AMBIENTAL, CONDIÇÕES SANITÁRIAS, DOENÇAS EMERGENTES E NEGLIGENCIADAS E POLÍTICAS PÚBLICAS NO MEIO-NORTE DO BRASIL

 

1. DOENÇA DE CHAGAS

Cremos que o estimado leitor já tenha ouvido alguma vez falar sobre a doença de Chagas, nome dado em homenagem a um grande médico e pesquisador sanitarista, Carlos Chagas. Como poderá ser evidenciado ao longo desse texto tem relação com a falta de saneamento básico, noções e condições básicas de higiene, carência de estrutura básica nas residências, proximidade de áreas desmatadas, processamento e consumo inadequado de frutos típicos da região Amazônica ou mesmo da cana de açúcar para obtenção e garapa. Trocando em miúdos: fatores socioeconômicos e ambientais contribuem fortemente para que pessoas sejam infectadas.

Trata-se de uma doença crônica, ou seja, sem cura, causada por um protozoário chamado Trypanosoma cruzi. O ciclo da doença inclui quatro organismos: o protozoário (agente etiológico causador da doença é invisível e só visto através de microscópio), potenciais reservatórios naturais que são animais que fazem parte de nossa fauna silvestre (exemplo: tatus, mucuras e ratos silvestres conhecidos como rabudos em nossa região), os barbeiros dos gêneros Triatoma ou Rhodnius (insetos) que funcionam como “ponte” ou vetores entre os reservatórios naturais infectados (animais silvestres) e o homem que seria o reservatório definitivo onde os sintomas se manifestariam acarretando graves prejuízos à saúde (veja figura ilustrativa do ciclo).

Nos ambientes naturais ou mesmo degradados os barbeiros podem picar o ser humano que mora geralmente em casas de taipa ou pau-a-pique, com péssimas condições sanitárias, sem telas, uso de mosqueteiros e próximas às matas ou áreas degradadas. A picada do barbeiro se dá principalmente na região do rosto, quando os mesmos sugam sangue e eliminam fezes repletas de protozoários causadores da doença. O ser humano ao coçar o local da picada faz com que as fezes adentrem a abertura da picada e os protozoários cheguem à corrente sanguínea do indivíduo. Pronto! Infelizmente infectou-se.

Nos estados amazônicos, principalmente no Pará maior consumidor e produtor de açaí e também no oeste maranhense até a região de São Luís, a contaminação via oral pode acontecer em diferentes graus devido ao hábito bastante comum de consumo de açaí in natura e da bacaba (fruta amazônica) cujas polpas e sementes precisam ser trituradas e muitas vezes sem as devidas precauções e protocolos sanitários. Convém destacar ainda a problemática em torno da garapa da cana de açúcar, que pode ocorrer em nossa região e há vários casos relatados em outras regiões brasileiras, uma vez que barbeiros podem ser triturados durante o processo de obtenção da saborosa garapa. No entanto, essa problemática pode ir além dessas regiões, com a venda de acaí, por exemplo, para outras regiões brasileiras e até para o exterior. O açaí é o principal produto da Sociobiodiversidade a gerar renda no Brasil.

Em 2018, dezenove novos casos foram registrados para o Maranhão, nos chamando atenção para a necessidade de mais estudos e políticas públicas, implicando em melhores condições de vida para o povo maranhense e do meio-norte do Brasil. Mais recentemente, em 2019, houve um surto epidêmico da doença em Barreirinha, no interior do estado do Amazonas, com dezesseis novos casos, sendo este o segundo surto apenas no ano de 2019.

Segundo artigo científico conceituado sobre revisão da prevalência da doença de Chagas no Brasil, publicado em 2014, a previsão seria de que o número de casos de doença no Brasil, em 2018, fosse cerca de 4,6 milhões de pessoas, e que a contaminação por alimentos mal processados e com restos de barbeiros triturados seria em maior número (açaís, bacabas e garapa da cana de açúcar).

Devemos parar de consumir açaís e garapas de cana? De modo algum. O que precisamos é nos resguardar para consumir produtos “seguros” em que tenhamos a certeza de que todos os processos disponíveis para evitar contaminação foram tomados, dentre os quais, a pasteurização. Selos, certificações podem fazer muita diferença.

No próximo texto trataremos sobre as pesquisas mais recentes sobre a Doença de Chagas e sobre os protocolos sanitários importantes para se diminuir o número de casos, incluindo desde a responsabilidade de cada cidadão até o poder público em suas diferentes esferas, principalmente no que se refere à elaboração de políticas públicas eficazes e cientificamente bem embasadas para combate a tal problemática, que inclui medidas sanitárias, mas também fomento às pesquisas científicas.

A CAPES (ligada ao Ministério da Educação) depois de tanto “arrancar” bolsas das pós-graduações brasileiras soltou um edital há poucos dias para fomentar, através de bolsas de pós-graduação, pesquisas epidemiológicas no Brasil. Para uma gripezinha até que se preocuparam… Que bom! Atenção coordenadores de pós-graduação do meio-norte e pesquisadores! Submetam propostas. Participem, por favor!

Obrigado pela leitura. Até breve. Aprofundaremos mais esse tema.

Texto assinado pelo:

Biólogo e Doutor Cleuton Lima Miranda

Biólogo pela universidade Federal do Piauí (2005). Mestre e Doutor em Zoologia pelo Museu Emílio Goeldi (2008 e 2016). Pós-doutor na área de Biodiversidade pela Universidade Estadual do Maranhão (2018). Professor EAD Universidade Federal do Piauí. Cidadão brasileiro e timonense. Filiado ao REPUBLICANOS 10.

Biomédico e Especialista Thalles Richard de Almeida

Biomédico habilitado em Patologia Clínica e Bioinformática aplicada à Saúde, com ênfase em Epidemiologia pela Universidade Uninassau (2019). Cidadão brasileiro e ludovicense.

PRINCIPAIS FONTES DE PESQUISA/CONSULTA:

1. ARGOLO, A. M.; FELIX, M.; PACHECO, R.; COSTA, J. DOENÇA DE CHAGAS E SEUS PRINCIPAIS VETORES NO BRASIL. RIO DE JANEIRO. 2007.

2. BOLETIM EPIDEMIOLÓGICO. 2019. PANORAMA DA DONÇA DE CHAGAS NO BRASIL. 50 (36): 1-7.

3. BRASIL, FUNDAÇÃO NACIONAL DE SAÚDE. MANUAL DE ORIENTAÇÕES TÉCNICAS PARA ELABORAÇÃO DE PROJETO DE MELHORIA HABITACIONAL PARA O CONTROLE DA DOENÇA DE CHAGAS. BRASÍLIA: FUNASA, 2003. 53 P

4. KROPF, S. P.; AZEVEDO, N.; FERREIRA L. O. 2009. DOENÇA DE CHAGAS: CONSTRUÇÃO DE UM FATO CIENTÍFICO E DE UM PROBLEMA DE SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL. REVISTA CIÊNCIA & SAÚDE COLETIVA. V. 5, Nº 2, P. 347-365.

5. MARTINS-MELO FR, RAMOS AN JR, ALENCAR CH, HEUKELBACH J. 2014. PREVALENCE OF CHAGAS DISEASE IN BRAZIL: A SYSTEMATIC REVIEW AND META-ANALYSIS. ACTA TROP. 2014;130:167–174. .

6. BOCCHI, E. A. 2019. OS DESAFIOS PARA VENCER A DOENÇA DE CHAGAS, UM PROBLEMA NEGLIGENCIADO. DISPONÍVEL EM: https://saude.abril.com.br/blog/com-a-palavra/os-desafios-para-vencer-a-doenca-de-chagas-um-problema-negligenciado

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Elias Lacerda

Elias Lacerda

Elias Lacerda
Jornalista apaixonado pela notícia e a verdade